Nicola Pamplona (Folhapress)
Prestes a receber ao menos R$ 3,5 bilhões pela concessão da Cedae (Companhia Estadual de Água e Esgoto), o governo do Rio de Janeiro agora busca obter até R$ 12 bilhões com a revisão no cálculo de participações especiais cobrados sobre a produção de petróleo no estado. Segundo o secretário estadual de Fazenda, Nelson Rocha, os recursos seriam devidos pelas petroleiras por interpretação equivocada das deduções de despesas que reduzem os valores pagos sobre a produção nos últimos cinco anos.
A arrecadação com o petróleo é alvo de uma CPI na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) e foi tema de um convênio assinado no último dia 15 entre o governo estadual e a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis).
O convênio amplia a fiscalização sobre as contas das petroleiras, que o Rio já vem fazendo em paralelo à ANP. "Existe muita coisa que, no nosso entendimento, foi deduzida indevidamente", disse o secretário, em entrevista à reportagem. "Não por má-fé, mas por uma interpretação da qual discordamos."
Segundo Rocha, o estado avalia a dívida entre R$ 8 bilhões e R$ 12 bilhões. A revisão do cálculo impactará também a receita futura, com aumento de arrecadação entre R$ 2 bilhões e R$ 3 bilhões por ano. Em 2020, ano de petróleo barato, o estado recebeu R$ 7 bilhões em participações especiais.
Enquanto os royalties são um percentual fixo sobre a produção, as participações especiais são uma espécie de imposto de renda cobrado sobre campos de grande produção de petróleo, calculadas após a dedução dos gastos das petroleiras em suas operações. O governo estadual analisa usar parte da receita adicional para antecipar o pagamento de dívidas com a União, se aproveitando de artigo da nova lei de recuperação fiscal que permite o uso de ativos para pagar os débitos.
Os ativos, nesse caso, seriam recebíveis lastreados em possibilidades futuras de receita. Rocha diz que o plano de recuperação em elaboração pelo governo Cláudio Castro vai propor a antecipação de algumas dívidas nos primeiros anos do programa. Outros ativos estão em análise, diz o secretário de Fazenda, como recebíveis de decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que reviu os valores do FPE (Fundo de Participação dos Estados) ou ativos ambientais, como créditos de carbono.
Único estado a aderir ao antigo regime de recuperação fiscal, o Rio foi o primeiro a ter a adesão confirmada no novo programa de socorro, em junho. Até dezembro, tem que apresentar um plano de recuperação, com propostas para cumprir as contrapartidas exigidas. Como já esteve no outro programa, diz Rocha, o Rio já avançou em algumas das exigências, como o aumento da alíquota previdenciária dos servidores e a realização de leilões reversos para liquidar restos a pagar, além da reestruturação de sua principal estatal, a Cedae. Agora, precisa aprovar uma lei de teto de gastos e avançar na reforma previdenciária, além de aprofundar medidas relacionadas a servidores e incentivos fiscais.
Com uma dívida de R$ 172 bilhões com a União, o estado diz que, sem o programa de socorro federal, teria que desembolsar R$ 63 bilhões em pagamentos ao Tesouro no próximos três anos. Caso o plano de recuperação seja aceito, o valor cai para R$ 9 bilhões.
Apesar dos ganhos bilionários com a concessão da Cedae, o governo do Rio espera incluir no novo plano a dívida de R$ 4,4 bilhões tomada em 2017 com o banco francês BNP Paribas para conseguir pagar o salário dos servidores estaduais. A dívida era garantida pela União, tendo as ações da companhia de saneamento como contragarantia, e venceu em 2020. A inclusão desse valor no novo pacote de socorro está em análise pela PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional).
Caso seja aceita, a receita do estado com a concessão da Cedae este ano sobe de R$ 3,5 bilhões para R$ 7,5 bilhões, diz Rocha. Outros R$ 1,5 bilhão serão transferidos à companhia como ressarcimento dos ativos. O valor corresponde a 65% do total que será pago pelas concessionários dos três lotes concedidos –um deles ficou sem interessados. O leilão, o maior de saneamento já feito no país, arrecadou um total de R$ 22 bilhões, mas parte do valor é dividido entre os municípios atendidos.
O secretário de Fazenda diz que, com a entrada de recursos e o aumento da arrecadação tributária, o estado deve fechar o ano com sem déficit financeiro. O déficit orçamentário deve ficar na casa dos R$ 3 bilhões.
O governador Cláudio Castro prometeu usar o dinheiro da Cedae em obras de infraestrutura, com o objetivo de tentar atrair empresas de logística para o estado. O pacote de obras deve ser anunciado nos próximos dias.