Quem passa pela região conhecida como Barrinha, obrigatoriamente precisa parar no Bar do Oswaldo. Fundado em 1946 por Oswaldo Cardozo, o local é point de muitos cariocas. O motivo, as famosas batidas. Filho de Oswaldo e atual proprietário, Rommel Cardozo contou para o Jornal da Barra a história dessa iguaria, que de geração em geração é a alegria de muitos moradores do Rio de Janeiro.
Jornal da Barra: O Bar é muito famoso pela batida. Poderia comentar sobre ela?
Rommel: Lá pela década de 40, meu pai criou uma bebida chamada “coquinho”. Ele fazia três furos no coco e esvaziava-o. Pegava a água, misturava com cachaça e acrescentava canela. Colocava dentro do coco de novo, fechava com três rolhas e enterrava. O coquinho passava uma semana enterrada dentro de um caixote. Quando tirava o coco, ele deixava pendurado com aroma. Quando essa bebida, que era um dos grandes atrativos da casa, fez sucesso, as mulheres que vinham para cá não a bebiam, porque era uma bebida forte, de cachaça. Tínhamos essa batida e a de limão, que foi a primeira a ser feita, e era muito forte. Por ser forte, as mulheres não bebiam. Depois, meu pai pensou que deveria fazer uma bebida que agradasse às mulheres. Começou a fazer uma bebida com vodca. Pegou o coco, raspou, bateu com vodca, colocou açúcar, gostou e começou a vender. Os homens faziam cara feia e pediam “bebidas de macho”. Então, meu pai colocava limão. Começaram a chamar de ‘Branquinha de Neve’ e um camarada chegou um dia e falou “Oswaldo, por que você não participa de um festival de batidas?” Meu pai se inscreveu e entrou com essa batida. Os jurados a beberam e falaram que a batida dele não se encontrava qualificada em nenhum dos quesitos, mas que ela não poderia sair de lá sem ser premiada. Então, a bebida dele foi campeã na categoria especialíssima. Nos deram um troféu de cristal também, que está aqui, mas guardado. A partir daquele momento, o bar explodiu. De 70 para cá, tivemos Chacrinha, Garrincha, que era da geração antiga. O Chacrinha sempre dizia “Alô alô Terezinha, eu quero mandar um abraço para o meu amigo Oswaldo”. Meu pai ficou conhecido como o Rei das Batidas. Na época, nossa parceira era a Orloff, que era da Seagram. A Seagram mandou fazer 1.000 camisas escritas “Oswaldo Cardozo, O Rei das Batidas”. Em 1979 fizeram uma homenagem para meu pai, “Oswaldo Cardozo, Bar do Oswaldo, o maior vendedor de vodca Orloff da América Latina nessa década”. Essa é a história do bar. E aí vem a história das pessoas que vinham e traziam suas namoradas tímidas. A frase que eu mais ouço na vida, até mesmo quando me conhecem: “Irmão, eu já fiquei com muitas mulheres por causa dessa batida”. É realmente um ícone. Tenho amigos que falam “Meu filho nasceu por causa da sua batida”. É uma brincadeira, mas eu considero essa batida “casamenteira”. Você sai com a namorada. Mulher, normalmente, não gosta de cerveja, de vinho, e você toma uma bebida que tem gosto de suco. É uma batida feita para saborear. Eu prefiro que muitas pessoas apreciem a poucas pessoas a beberem muito. A batida não foi criada para embebedar ninguém. A batida não foi criada para embebedar ninguém, mas sim para saciar as pessoas, para comemorarem. Uma vez, um cliente chegou e pediu algo para afogar as lágrimas. Eu disse que não tínhamos nada aqui, porque aqui só se comemora, se você está triste ou depressivo, não beba. Isso ficou marcado para mim, porque eu passei 30 anos atrás daquele balcão, atendendo diretamente. E quando você trabalha 30 anos no mesmo lugar, fazendo a mesma coisa, lidando com o público, aquilo passa a ser um público variado, porque eu não via repetir cliente. Tem muitos clientes fieis, mas esses eu já considero amigos, já fazem parte da casa. Todo sábado temos uma feijoada, que, pelo menos, atrai umas 350 pessoas. Geralmente, o pessoal muda em pelo menos 20% a cada edição.
Jornal da Barra: A idade às vezes chega, mas muitos que apreciam a bebida desde o início jamais a esquecem...
Rommel: Eu tenho uma bike e um food-truck. Nós levamos essas engrenagens para os eventos e quando aparecem, sempre ficam surpresos perguntando “a batida do Oswaldo ainda existe?”. Todos têm uma história lá e isso é muito rico para mim. Eu valorizo demais e acho que é uma coisa que está aí para ajudar a contar as histórias das pessoas, porque quando você tem um bar aberto do mesmo jeito, no mesmo lugar, durante tanto tempo, não há quem não dê uma passada por aqui e se lembre. Imagina um marido falando para a esposa “lembra de quando vínhamos no bar tomar a batida?”. Essa poltrona, na qual estou, é a mesma que o cara veio e ficou namorando com a menina, eu apenas reformei.
Jornal da Barra: Você se refere aqui como Largo da Barra, quando, na verdade, muitos dizem que a região onde está a Igreja São Francisco de Paula é Largo da Barra. Qual nomenclatura está certa e qual não está?
Rommel: Costumam se enganar dizendo que a Igreja é Largo da Barra. Eu não reconheço porque quem da nome é quem vive. E ali é outro nome. Aqui no Largo da Barra, a única coisa definida de verdade é que aqui é o Largo da Barra. Só para você ter uma ideia, aqui tinha o lotação, ele fazia contorno no Largo da Barra. Então, se tem um lugar que o ônibus fazia lotação, vinha da Tijuca na década de 30, 40, não tem como você aceitar que alguém vai dizer que você mora na Barrinha se você conhece, tradicionalmente, como Largo da Barra. Largo é um local onde você faz a volta e isso aqui é um largo. Histórica e geograficamente, é um largo. Se fosse para ser no outro lado, teria que ser na Praça do Pomar, mas não é. Aqui é um centro. Geograficamente, aqui também é um vale. Poderia ser Vale da Barra. Aqui só é Barrinha porque começaram a chamar assim e algum órgão oficial começou a colocar o nome de Barrinha. E uma mentira contada mil vezes se torna verdade. Meu pai chamou isso aqui de Largo da Barra a vida inteira. Sempre falou: “Sou o comerciante mais antigo do Largo da Barra”. Então, eu ouvi isso a minha vida inteira e todo mundo que se refere a esse lugar como Largo da Barra. Quando eu chego a qualquer reunião eu digo que moro no Largo da Barra. E alguém fala que ali é Barrinha eu pergunto se a pessoa conhece a história. Se você não conhece, então por favor não repita isso. Se quiser dizer que aqui é Barrinha, pode dizer, as pessoas podem chamar isso de Barrinha. Mas eu acho que a Prefeitura deveria colocar uma placa escrita ‘Largo da Barra’ e embaixo ‘Barrinha’, como apelido.
Jornal da Barra: Rommel, uma mensagem para os admiradores do Jornal e, muito provavelmente, fãs da batida do Bar do Oswaldo.
Rommel: Olha, existem muitos bons bares na Barra e gostaria muito de prestigiar cada um deles. Mas a história da Barra começa aqui, no Largo da Barra, onde o pessoal costuma chamar de Barrinha. Não importa se é Barrinha ou Largo da Barra, o que importa é que quero convidar vocês para vir aqui experimentar e respirar esse ar bucólico no Bar do Oswaldo, porque estamos no pé da Pedra da Gávea há 71 anos. E acho que, além do mar, a pedra é um dos grandes cartões postais da Barra. Eu não sou de dar elogios a quem não merece, e o que vou falar aqui é o seguinte: o Jornal da Barra está de parabéns pela mudança que soube fazer. Muitas pessoas precisam de coisas para vender no jornal, mas, sabendo contar bem a história, você vende até aquilo que as pessoas ainda não conheciam. Produtos bons não são os que as pessoas já compram há muito tempo, mas produtos que talvez não tenham sido muito bem mostrados, e o que vocês estão fazendo é dar valor ao que tem que ser valorizado. O Jornal da Barra tem que valorizar as coisas da Barra e vocês estão de parabéns.