O Canal da Joatinga é a única comunicação que o Complexo Lagunar de Jacarepaguá tem com o mar.
O Canal da Joatinga é a única comunicação que o Complexo Lagunar de Jacarepaguá tem com o mar. É por lá que as lagoas respiram e trocam suas riquezas naturais. São peixes que adentram pelas lagoas para desovar e cardumes de novos organismos que retornam para povoar o oceano. Este é um dos ciclos da natureza além de outros que renovam a matéria orgânica.
A ocupação e o adensamento humano na Baixada de Jacarepaguá trouxe inúmeros desequilíbrios oriundos de aterros, lançamento de poluentes e outros que modificaram seu
equilíbrio natural. Para reequilibrar o sistema lagunar uma das principais premissas é a recuperação da sua capacidade de troca d'água e de matéria orgânica perdida ao longo dos
anos pelo assoreamento lagunar além do estrangulamento do Canal da Joatinga.
Fica claro que a dragagem lagunar e a extensão do guia corrente da Joatinga, erroneamente
chamada de quebra-mar, vem resgatar um déficit de infraestrutura acumulada ao longo dos últimos 40 anos (1975-2015). Trata-se de uma ação mitigadora contra os impactos gerados pelo crescimento desordenado da região onde boa parte dos resíduos (lixo
e esgoto), não recolhidos, termina no fundo das lagoas ou ao longo dos rios e canais. Não
é sem motivo que a maioria dos rios urbanos são mortos. Na Baixada de Jacarepaguá não
é diferente. Caso queiramos recuperar o que resta das lagoas vivas, medidas imediatas e
eficazes devem ser iniciadas o quanto antes.
Em um mundo ideal, lixo e esgoto deveriam ser retirados na porta das casas. Em um mundo ideal a infraestrutura urbana (rede pluvial, saneamento, calçadas e ruas, energia e água) vem antes da permissão de construir e ocupar. O Rio de Janeiro está longe disso. Num mundo real, lixo e esgotos se misturam nos rios urbanos. Assim, na realidade precisamos limpar os rios antes que estes desaguem suas águas contaminadas nas baías e lagoas.
Num mundo real, sabe-se que concomitantemente com a meta de universalizar os serviços de lixo e esgoto, é preciso limpar os rios, pois trata-se de uma intervenção mais objetiva e rápida. Assim, a dragagem para retirar o passivo ambiental representado pelo lixo e lodo acumulado no fundo dos rios e lagoas bem como a manutenção da abertura com o mar por onde acontece a renovação passiva de suas águas interiores, são a garantia da salubridade dos corpos d'água costeiros.
Infelizmente muitas das teses que se ouvem dos profetas do ideal não atendem minimamente as demandas do mundo real. Dificilmente estas propostas são exequíveis e iludem a sociedade para a realidade do possível. Enquanto se fica discutindo o ideal, a natureza vai morrendo e as ações de recuperação não saem do papel. Neste contexto existe um ditado que muito bem representa esta situação: "Quer-se o ótimo, despreza-se o bom e fica com o péssimo, que é o nada".
Apesar desta evidente necessidade da urgência de ações de recuperação ambiental nos deparamos com os atrasos e mesmo impedimentos representados pelos paradoxos do preciosismo e do conjunto, que talvez expliquem a razão desta falta de decisão.
O paradoxo do preciosismo fundamenta-se no exagero do rigor técnico e da burocracia legal gerado pelos procedimentos e protocolos perfeitos que nada tem a haver com a realidade imperfeita. Normalmente são especialistas de gabinetes que não tem uma visão de conjunto, que acreditam piamente em cartilhas temáticas e são insensíveis com as necessidades da natureza viva além de não terem compromisso com os resultados. Mesmo sendo indutores de prejuízos ambientais, jamais serão processados por isso no futuro nem se preocupam com as consequências para o meio ambiente. Muitas vezes a falta de ação é ainda pior do que não se tentar uma ação de recuperação.
O paradoxo do conjunto é aquela em que se acredita que existe apenas uma única solução e mágica que consiga resolver todo um conjunto de problemas ambientais. Não se consegue perceber que para atender problemas ambientais diversos e complexos são necessárias inúmeras alternativas diferentes e concomitantes, de ações. Se mal conseguimos estabelecer o consenso de uma ação, imagina se teremos maturidade para enxergar as qualidades do conjunto das outras ações propostas.
Talvez o melhor antídoto para estes paradoxos seja misturar um pouco de inteligência com bastante bom senso e retirar toda vaidade daqueles que só sabem impor a sua solução. A maior virtude para se encontrar a verdade é ter a generosidade de saber considerar todas as realidades e a capacidade de atender a todas elas.
Pense, acorde e seja bem vindo ao mundo real.
Prof. David Zee
Vice-Presidente da Câmara Comunitária Barra da Tijuca