Carlos Petrocilo (Folhapress)
Dos 365 dias do ano, a dupla norueguesa de vôlei de praia Anders Berntsen Mol, 23, e Christian Sorum, 25, passa pelo menos 250 perambulando pelo mundo em busca de lugares mais quentes para treinar, como a Espanha, por exemplo. A Noruega, ao norte da Europa, é um país de belas praias, mas com inverno rigoroso.
O vôlei, seja na areia ou na quadra, não é tradicional por lá. Líderes do ranking mundial, Mol e Sorum são a grande sensação do circuito e vão para os Jogos de Tóquio como favoritos ao ouro.
Jovens e simpáticos, eles têm cativado o público com postagens nas redes sociais e vídeos no canal Beachvolley Vikings, no Youtube, nos quais registram melhores momentos dos jogos, viagens e a vida fora das competições.
"Temos muitos seguidores no Brasil, estão entre os top 5, e é incrível como o esporte significa para eles. Queremos levá-los na nossa jornada, é legal dividirmos isso", diz Sorum à Folha. Juntos, os atletas têm mais de cem mil seguidores no Instagram -contando os perfis pessoais e da dupla.
Com uma população estimada de 5,5 milhões de pessoas, equivalente a quase a metade da cidade de São Paulo, a Noruega é uma potência na Olimpíada de Inverno. É o país com mais triunfos nesse evento. São 368 medalhas no total (132 de ouro, 125 de prata e 111 de bronze) ante 305 conquistadas pelos Estados Unidos (105 de ouro, 112 de prata e 88 de bronze).
"É especial jogarmos vôlei de praia porque não é algo muito norueguês. É um esporte sempre sob o domínio do Brasil, dos Estados Unidos, as grandes nações [na modalidade]", explica Mol. "Ser da Noruega e competir com os melhores do mundo significa algo muito grande para nós."
Caso confirmem o favoritismo, o pódio será inédito para o vôlei norueguês. Ex-atleta da modalidade, a mãe de Mol, Merita Berntsen -vice-campeã europeia (1995)- tentou essa proeza em Atlanta-1996, mas foi eliminada nas primeiras rodadas ao lado de Ragni Hestad.
"Meus pais são muito envolvidos com o voleibol, o meu pai treinou times na Noruega e a minha mãe ficou em nono lugar em Atlanta. Eles são meus ídolos também e podemos ser melhores do que eles foram. É épico como tudo isso aconteceu", afirma Mol, que começou a praticar o esporte aos cinco anos, primeiramente na quadra.
"Foi muito natural escolher o vôlei de praia. Ser parte do melhor time do mundo é incrível, especialmente por ser da Noruega, onde há muito frio, não tem as condições ideais nas praias. Treinamos nas quadras durante o inverno, mas vamos para outros lugares da Europa, como Tenerife na Espanha", diz Mol.
A dupla é uma ameaça para os brasileiros Alison e Álvaro. O primeiro conquistou medalha de prata em Londres-2012 e o ouro no Rio-2016. Outro perigo para os brasileiros são os compatriotas Evandro e Bruno Schmidt. Parceiros em 2016, Alison e Bruno são os atuais campeões olímpicos, mas se separaram no final de 2017. Desde então, viram os noruegueses faturarem o Circuito Mundial em 2018 e 2019.
"O Alison e o Bruno foram grandes exemplos para nós", conta Sorum. "Nosso primeiro torneio foi incrível. Sentar à mesa com os caras que são nossos ídolos..."
Em busca do tricampeonato, a dupla norueguesa conquistou duas etapas das quatro do circuito, enquanto Alison e Álvaro ficaram com o bronze em uma delas. "Nunca descarte os brasileiros", alerta Sorum. "Nunca jogamos uma Olimpíada, e essa será bem diferente."
Para Mol é preciso ter cautela, e o adiamento dos Jogos para julho deste ano, por conta da pandemia de Covid-19, trouxe equilíbrio entre os concorrentes ao pódio olímpico. "Em 2018, 2019 éramos os melhores. Ganhamos vários torneios e estávamos em uma boa sequência. Todo mundo está igual para Tóquio, uma folha em branco. Não sabemos quem é o melhor, quem é o pior", diz o atleta. "Vencer as duas últimas etapas no México foi uma injeção de confiança para nós."
O pai de Mol é quem treina a dupla. Kåre Mol e a mãe, Merita, passaram a trabalhar com eles em 2015. Os irmãos e primos também auxiliam durante os treinos. "Sempre sonhamos ir para Tóquio. Nunca pensamos em ser o cabeça de chave número 1, nem os favoritos", conta Mol. "Treinar com meu irmão e meu primo também é incrível. Nos tratamos como família, e Christian foi adotado. Fico feliz de compartilhar isso."
Além da paixão vir de berço, os noruegueses contam que tiveram influências da dupla brasileira Ricardo e Emanuel, uma parceria de sucesso nos anos 2000. Os brasileiros conquistaram a medalha de ouro em Atenas-2004 e bronze em Pequim-2008, além de títulos do Circuito Mundial (2003, 2004, 2005, 2006 e 2007).
"Nossos pais se conheceram nas quadras. Nos anos 1990 tivemos bons times de vôlei na Noruega. Nos apaixonamos pelo esporte também, ficamos encantados de ver o Ricardo e o Emanuel, além de outras grandes duplas. Então comecei a jogar na escola", recorda Sorum.
Com 1,92 m de altura, ele tem enfileirado conquistas individuais de melhor defensor, e Mol, de 2 metros, de melhor bloqueador e jogador ofensivo do circuito.