Denúncia afirma que esquema movimentou aproximadamente R$ 6,5 milhões em superfaturamento e contratação de fornecedores laranjas em contratos da entidade
Uma operação do Ministério Público do Rio de Janeiro e da Polícia Civil levou à prisão nesta quinta-feira (23) do ex-dirigente da organização social Iabas Luiz Eduardo da Cruz e mais três pessoas por supostos desvios de recursos em contratos com a prefeitura.
Segundo a denúncia, o esquema movimentou cerca de R$ 6,5 milhões em superfaturamento e contratação de fornecedores laranjas em contratos da entidade com a Secretaria Municipal de Saúde do Rio.
Cruz e a esposa dele, Simone Amaral da Silva Cruz, foram presos em um condomínio de luxo na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio. O casal já havia sido preso em 2018. Também foram detidos Marcos Duarte da Cruz, irmão de Luiz Eduardo; e o empresário Francesco Favorito Sciammarella Neto. Eles foram levados à Cidade da Polícia, no Jacarezinho, zona norte do Rio.
A polícia ainda procura Adriane Pereira Reis, que é apontada como testa de ferro de Luiz Eduardo e Simone, segundo as investigações.
Os crimes investigados são peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Além dos mandados de prisão, foram cumpridos outros 16 de busca e apreensão em residências e empresas suspeitas de integrarem a organização criminosa. Alguns mandados foram cumpridos em São Paulo com apoio do Ministério Público do Estado de São Paulo e da Polícia Civil de São Paulo, um deles na sede do Iabas.
A investigação apontou que a antiga gestão do Iabas recebeu entre os anos de 2009 e 2019, período dos governos do ex-prefeito do Rio, Eduardo Paes, e do atual Marcelo Crivella, cerca de R$ 4,3 bilhões em recursos públicos. No entanto, o instituto nunca apresentou prestação de contas sobre a aplicação dos recursos de saúde pública que foram destinados a ele.
Com isto, teria sido montado um complexo esquema onde a empresa dissimulava os desvios destes recursos com repasses fraudulentos de verbas para empresas intermediárias prestadoras de serviços. Ainda é desconhecida a informação de quando esse esquema começou a operar.
A lavagem do dinheiro superfaturado era feita através da simulação de empréstimos, transações financeiras e pagamentos de cheques fracionados, que tinham como destinatários finais funcionários ou parentes de Luiz Eduardo e seu filho Daniel Murici Cruz, também investigado.
Além do Rio, o Iabas também firmou contratos com os governos de Mato Grosso do Sul e da capital paulista. Em abril deste ano, a organização já havia recebido cerca de R$ 5,2 bilhões de dinheiro público em contratos nos três estados.
Por meio de nota, a Prefeitura do Rio afirmou que o Iabas foi desqualificada da atual gestão do prefeito Marcelo Crivella, que herdou a contratação do governo anterior, que era do ex-prefeito Eduardo Paes. Ainda segundo a prefeitura, Crivella desqualificou a Iabas, após um processo com ampla defesa, por não atingir 50% das metas propostas no contrato de gestão.
O motivo da desqualificação, portanto, conforme a nota da prefeitura, foi má gestão dos recursos públicos, gerando desassistência aos usuários. A desqualificação do Iabas foi publicada no Diário Oficial do município no dia 25 de abril de 2019. A prefeitura atual ainda multou o Iabas em R$ 27,9 milhões.
O Iabas também é investigado pela Procuradoria-Geral da República por irregularidades na instalação dos hospitais de campanha abertos pelo estado do Rio para a pandemia do novo coronavírus . No último dia 26 de maio, durante a Operação Placebo, agentes da Polícia Federal cumpriram mandados de busca e apreensão em endereços ligados à organização social no Rio.
Conforme a PGR, o instituto fraudou documentos e superfaturou o valor de insumos para as unidades temporárias. O esquema teria a participação de agentes públicos, entre eles, gestores da secretaria estadual de Saúde, responsáveis pelo processo de compra.
Na ocasião, também foram feitas buscas contra o governador Wilson Witzel (PSC), a mulher dele, a advogada Helena Witzel, e o ex-secretário Edmar Santos, preso no último dia 10 em um desdobramento da Operação Mercadores do Caos, que também investiga superfaturamento na Saúde do estado.
Outro lado
Por meio de nota, o Iabas afirmou que a operação de busca e apreensão foi relativa a contratos de gestão com a prefeitura que não estão mais vigentes.
Ainda conforme a nota, a investigação da Promotoria não abrange os contratos dos hospitais de campanha com o governo do estado do Rio de Janeiro, nem com os contratos mantidos com a Prefeitura de São Paulo e o governo de Mato Grosso.
O Iabas diz ainda que colabora com as autoridades, mas ressaltou que mantém "estritos padrões de comportamento ético e legal e que presta regularmente contas de suas ações aos órgãos de controle das entidades contratantes e aos Tribunais de Contas".
Ainda de acordo com a OS, todas as suas prestações de contas relativas aos contratos com a Prefeitura do Rio foram aprovadas, apenas as informações de 2019 ainda estão sob análise.
O instituto disse ainda que aguarda o desenvolvimento das investigações para saber o que há de concreto nas ilações apresentadas pelo Ministério Público do Rio. "Por fim, o IABAS ressalta que Luiz Eduardo Cruz não possui mais nenhuma relação com o instituto desde setembro de 2017. A direção do IABAS desconhece que qualquer empresa ligada à família de Luiz Eduardo Cruz mantenha contrato com a instituição".
Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde do Rio afirmou que, durante a gestão Eduardo Paes, "sempre atuou com transparência e lisura em todos os seus processos. As empresas citadas ganharam processos licitatórios com comissões independentes e, diferentemente do momento atual, não receberam contratos emergenciais".
Daniel Soranza, ex-secretário de Saúde da gestão Eduardo Paes, informou que, durante o governo do ex-prefeito, a pasta "sempre atuou com transparência e lisura em todos os seus processos. As empresas citadas ganharam processos licitatórios com comissões independentes e, diferentemente do momento atual, não receberam contratos emergenciais".
Ainda segundo Soranza, "deve-se ter cautela para evitar julgamentos precipitados e respeitar os processos jurídicos". A reportagem não conseguiu localizar a defesa dos demais presos na operação.