Júlia Barbon e Guilherme Garcia (Folhapress)
Depois dos nonagenários, dos octogenários e dos septuagenários, o impacto da vacinação contra a Covid-19 já se estende para os sexagenários. Uma redução nas internações e mortes pela doença no grupo tem sido registrada nas últimas semanas, à medida que a imunização avança.
O Brasil deu a largada na vacinação maciça das pessoas de 60 a 70 anos no início de março. A partir de meados de abril, a tendência de queda começa a ser visível: a faixa etária, que representava 23% dos hospitalizados e 29% dos mortos na época, despenca para 11% e 16% em junho.
Em números absolutos também há uma diminuição constante e expressiva no período. Se na última semana de março 5.737 pacientes dessa idade morreram da doença, foram apenas 865 na segunda semana de junho, seis vezes menos.
Os dados tabulados pela reportagem são do Ministério da Saúde e consideram pessoas internadas por síndrome respiratória aguda grave (Srag) em qualquer tipo de leito. O intervalo analisado foi até o último dia 12, levando em conta o tempo para as notificações.
Esse é mais um número a se somar ao diagnóstico de rejuvenescimento das vítimas do coronavírus no país. Já era possível observar uma queda do agravamento dos casos nos grupos de 90 e 80 anos desde o fim de fevereiro, e no grupo de 70 anos desde abril, na contramão dos mais jovens.
O epidemiologista e demógrafo Raphael Guimarães, pesquisador da Fiocruz, diz que esse "seguramente é um efeito da vacina". "O que a gente tem observado é que, à medida em que o país consegue vacinar idosos mais novos, a participação dessas faixas em mortes e internações se reduz", afirma.
Ele reforça que a faixa dos 60 anos vinha contribuindo de forma ampla para os casos graves da Covid desde o início do ano, representando em torno de 1 em cada 4 hospitalizações. "De umas quatro ou seis semanas para cá, porém, houve uma inversão na curva", analisa.
Um estudo da UFPel (Universidade Federal de Pelotas), em parceria com a Universidade de Harvard e o Ministério da Saúde, mostrou recentemente que a vacinação já evitou a morte de 43 mil pessoas acima de 70 anos, após análise de mais de 200 mil óbitos por Covid-19 entre janeiro e maio deste ano no país.
"Se tivéssemos começado a vacinar a população antes, essa estimativa de mortes poupadas pela vacinação seria maior ainda", diz o epidemiologista Cesar Victora, líder da pesquisa que traz pela primeira vez evidências da efetividade das vacinas Coronavac e AstraZeneca no Brasil.
Até agora, 29% da população adulta (46 milhões de pessoas) tomou a 1ª dose da vacina, e 16% (26 milhões) está totalmente imunizada (tomou a segunda dose ou vacina de dose única).
Agora, a preocupação é com os mais jovens. A proporção de pacientes internados com 40 a 60 anos disparou de 17% para 40% desde o início do ano. A faixa de até 40 anos também dobrou de 5% para 11%.
Um boletim epidemiológico da Fiocruz que analisa dados nacionais até 12 de junho indica que a mediana de óbitos pelo vírus caiu pela primeira vez a um nível abaixo dos 60 anos, assim como já havia ocorrido com as internações.
Isso significa que a idade máxima de metade dos hospitalizados passou de 66 anos no início do ano para 52 anos agora. Já entre as vítimas que morreram da doença, foi de 71 anos para 61 anos no período.
"É verdade que esse processo tem relação com um estreitamento do topo da pirâmide etária da doença, já que os mais longevos contribuem cada vez menos com casos graves e fatais. Contudo, temos em termos absolutos maior número de casos e óbitos entre jovens, de forma independente ao que ocorre com os idosos", escrevem os pesquisadores.
"Este é um cenário extremamente preocupante, especialmente para um país cuja estrutura etária ainda é relativamente jovem. O que virá, com a manutenção deste quadro, será verdadeiramente uma onda: de incapacidade e condições crônicas para brasileiros jovens, que perderão em qualidade de vida e capacidade produtiva", alertam.
Eles avaliam ainda que o rejuvenescimento dos atingidos pela Covid será cada vez mais intenso e "poderá perpetuar um cenário obscuro de óbitos altos" até que esse grupo etário esteja devidamente coberto pela vacina. Portanto, é essencial reforçar o uso de máscaras e o distanciamento social.