O veto foi publicado na edição desta quinta-feira (10) do Diário Oficial da União
O veto do presidente Jair Bolsonaro ao auxílio de R$ 4 bilhões aos sistemas de transporte público no país foi visto com "perplexidade" e considerado "lamentável" por prefeitos, empresários e entidades do setor, que argumentam que o bloqueio do recurso pode colapsar os sistemas de ônibus, metrô e trens.
O veto foi publicado na edição desta quinta-feira (10) do Diário Oficial da União. O projeto de lei aprovado pelo Congresso injetaria recursos nos sistemas de transporte público de cidades com mais de 200 mil habitantes, que, com perdas de passageiros que passaram dos 80% nos momentos de maior agravamento da pandemia, começaram a entrar em colapso.
A medida surpreendeu entidades da área porque o texto havia sido articulado com o próprio governo federal.
Pelo projeto, o recurso seria liberado com contrapartidas como a exigência de que as cidades não fizessem cortes ou redução abrupta da oferta, a garantia da frota necessária para atender a população com segurança sanitária e a garantia de gratuidades. Além disso, incentivava também a criação de faixas exclusivas de ônibus pelas prefeituras, bem como ciclovias e áreas para pedestres.
A ideia inicial, no começo da pandemia, era um auxílio de R$ 6 bilhões, valor que baixou após negociações para R$ 4 bilhões. Estimativa do setor estipulam mais de R$ 14 bilhões de prejuízos em sistemas de ônibus, metrôs e trens pelo país.
O Ministério da Economia argumentou que a medida não apresenta estimativa do impacto orçamentário e financeiro; que a aplicação dos recursos poderia ultrapassar o período de calamidade pública, podendo acarretar redução de receita (o que demandaria apresentar uma medida compensatória); e que esbarra em recomendações do TCU (Tribunal de Contas da União) que estabelece que os recursos só podem ser executados durante o estado de calamidade.
A FNP (Frente Nacional de Prefeitos), fórum que reúne mandatários das maiores cidades do país, soltou nota em que disse ter recebido a notícia "com perplexidade".
"Cabe lembrar que a intensa negociação desse projeto emergencial, envolvendo União, parlamentares, estados e municípios, se arrastou por longos oito meses, justamente pela morosidade que o governo federal imprimiu ao processo. E, agora, alega na justificativa do veto que a lei 'poderia ultrapassar o período de calamidade'", diz a entidade.
A FNP diz que o veto trará mais dificuldades ao setor - que enfrenta crise devastadora, e que o colapso do sistema representa desafio aos prefeitos que tomam posse em janeiro, período de reajuste das tarifas.
"Brasília demonstra não ter aprendido com as manifestações de 2013. Alguns gabinetes lavam as mãos e alegam se tratar de uma responsabilidade exclusivamente local, como não se tratasse de uma política pública evidentemente federativa e estratégica para o país. O resultado dessa omissão federal poderá ser um apagão de proporções desconhecidas", diz a FNP, em referência aos protestos que começaram contra o reajuste em tarifas de ônibus e paralisaram o país.
Rafael Calabria, coordenador de mobilidade do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor), diz que o auxílio seria positivo por não apenas injetar dinheiro nas empresas, mas pelas contrapartidas que exigia. "E deixaria um legado, também pelo fato de o governo federal investir no transporte público, algo que é previsto desde 2012, mas que não ocorre, deixando os sistemas a cargo das prefeituras", diz.
Ele afirma que o problema não ocorre apenas no Brasil, mas no mundo todo, e cita a ajuda de R$ 25 bilhões dada pelo governo dos Estados Unidos aos sistemas de transporte público americanos em abril.
A ANPTrilhos, entidade que representa os serviços de metrô, trem urbano e VLTs, afirmou que "recebeu com indignação a decisão presidencial". "A falta de recursos afetará milhões de brasileiros que só tem o transporte público como meio de deslocamento", disse, em nota.
Segundo a entidade, os sistemas metroferroviários do país já têm déficit de mais de R$ 7 bilhões desde março em termos de receita tarifária.
"Setores como aviação civil e energia elétrica foram rapidamente socorridos pelo governo federal, mas o setor de mobilidade, que garante o deslocamento do cidadão nas cidades, incluindo aqueles que trabalham na linha de frente para o combate ao coronavírus, tem sido relegado pelas autoridades", diz a ANPTrilhos.