Vítima deixa cinco filhos e esposa
A Polícia Civil do Rio de Janeiro indicou três funcionários e o representante legal de uma empresa contratada por um condominio de luxo na Barra da Tijuca, pelo homicídio do pedreiro Clailton Jorge Teixeira da Costa, de 40 anos, por ilegal de arma de fogo, usurpação da função pública e fraude processual. Segundo as investigações, atuando irregularmente com revólveres no espaço considerado logradouro público, eles atiraram cinco vezes contra o homem e editaram as imagens de câmeras do circuito interno que teriam flagrado o crime.
De acordo com o relatório final do inquérito, era por volta das 6h do dia 28 de janeiro, quando Clailton foi baleado na cabeça. A parte traseira do seu veículo foi atingida por cinco disparos feitos por Eduardo do Nascimento Gonçalves e Felipe Oliveira Vieira, ambos do Grupo Hawk Segurança e Vigilância Ltda. A empresa foi contratada pelo Condomínio Del Lago para prestação de serviços de segurança armada, monitoramento de câmeras do circuito interno, jardinagem e limpeza.
Em depoimento que prestaram na 16ª DP (Barra da Tijuca), Eduardo do Nascimento e Felipe Oliveira contaram que abordaram a vítima após constatarem que Clailton havia furtado seis baldes de massa acrílica, um rolo de 20 metros de cano de cobre e um ancinho de uma obra de uma casa no condomínio. De acordo com eles, o pedreiro teria concordado em parar, mas, quando teve conhecimento de que a Polícia Militar seria chamada, tentou fugir e jogar o veículo em cima dos vigilantes.
Clailton foi levado ainda com vida para o Hospital Municipal Miguel Couto, e diante da narrativa apresentada pelos vigilantes, ele foi preso em flagrante pelo roubo impróprio (com emprego de violência ou grave ameaça), e a ação dos seguranças, que foi classificada como legítima defesa. Entretanto, com a conclusão da necropsia do Instituto Médico Legal (IML) e da perícia do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) no local e nos vídeos apresentados, o teor das declarações prestadas pelos vigilantes na distrital começou a ser questionado a veracidade.
Enquanto o laudo do IML definiu posteriormente a causa da morte de Clailton por um disparo na cabeça, os peritos do ICCE demonstraram a adulteração nas mídias de vídeo das gravações.
“Coincidentemente, as imagens fornecidas pela Hawk são somente aquelas que, em tese, demonstram o possível crime de furto praticado por Clailton. Absolutamente nenhuma câmera que tenha relação com a abordagem dos vigilantes foi apresentada. Pelo princípio da boa-fé objetiva e o manifesto interesse pelo ônus probatório, a empresa seria a maior interessada em fornecer as imagens que comprovariam a versão narrada pelos seus prepostos”, destaca um trecho do documento, assinado pelo delegado Leandro Gontijo, titular da 16ª DP.
O Advogado José Dimas Marcondes, que representa a viúva do pedreiro, destaca: “Embora o indiciamento represente uma vitória, a decisão não deve ser comemorada, porque se trata de conclusão lógica que ocorre com atraso de oito meses. Os autores dos disparos estão em liberdade e a família de Clailton enfrenta sérias dificuldades financeiras, sem nenhum auxílio material”.
O relatório ainda conclui que “os vigilantes, em franca usurpação da função pública de policiamento ostensivo, portando arma de forma ilícita, o constrangeram mediante grave ameaça para que ele saísse do carro, encostasse na parede e aguardasse a presença da PM”.
“Estávamos juntos há 19 anos, tivemos cinco filhos e a rotina do meu marido era ir de casa para o trabalho e do trabalho para casa. Ele não ficava na rua, não tinha vícios. Era o provedor da família e, diante dessa tragédia, estamos desamparados. Não acredito que ele estivesse furtando, mas, ainda que a versão dos seguranças fosse verdadeira, teriam que prendê-lo e não matá-lo com um tiro na cabeça”, emocionou-se Kelly Cristina Bernardino, de 38 anos, viúva de Clailton.
Os vigilantes Eduardo e Felipe foram indiciados por homicídio, porte ilegal de arma de fogo e usurpação de função pública. Michel Borges da Silva, representante legal da Hawk, vai responder por homicídio por omissão, port ilegal de arma, fraude processual e favorecimento real. O inquérito aponta que ele sabia que o local é uma associação de moradores onde não poderia ser exercida a segurança armada, apenas vigilância, com a observação de residências para, em caso de problemas, acionar a polícia. Foram pedidas as prisões preventivas dos três. O caso foi remetido ao Ministério Público.
Trecho de vídeo editado
O técnico de TI Alex Dias Braga, também funcionário da Hawk, irá responder por favorecimento real, fraude processual e falso testemunho. Em depoimento, o profissional afirmou que as câmeras funcionam mediante sensibilidade de movimentação e que as imagens eram apagadas a cada cinco dias. Entretanto, nos vídeos apresentados, há diversas filmagens sem movimento e trechos de interesse para a investigação foram cortados.
O advogado Nicolas Dante Di Iulio, que representa o Grupo Hawk Segurança e Vigilância Ltda, afirma estar confiante “no espírito de justiça e nas instituições” e que “exercerá com ética a ampla defesa, onde será provada a completa inocência” dos funcionários.
Nicolas afirma que os vigilantes agiram em legítima defesa, sem intenções de matar o pedreiro. “Os disparos foram efetuados para tentar impedir que o Claillton se evadisse do local com a res furtiva e, para evitar que atropelasse os próprios moradores ou transeuntes que estivessem ali circulando, caminhando de manhã ou mesmo crianças que estariam indo para escola com seus pais ou indo pegar a van escolar”, alega em nota.